29/09/2020

Teletrabalho - Ergonomia, Direito e Gestão


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Eduardo Pastore
Jair Ferreira Pinto
Luíza Melo
 

Muito se tem dito sobre teletrabalho, que não é sinônimo de home office. Home Office é uma expressão da língua inglesa que utilizamos erroneamente para designar quem trabalha em casa. Se fossemos usar o termo em inglês para designar aquele que trabalha em casa, seria work from home, ou, literalmente, trabalho de casa. A expressão home office significa um espaço físico para a existência de um escritório, que pode ser utilizado para várias atividades, dentre elas o trabalho. Quem trabalha em casa, trabalho realizado na casa do empregado, por exemplo, é um teletrabalhador, que é o trabalho realizado a distância e com meios telemáticos, como celulares, computadores, dentre outros. Está na Lei 13.467/17, que regulamenta o teletrabalho. Portanto, o trabalho de casa é um tipo de teletrabalho, designado em inglês como work from home.

Feita esta consideração de ordem conceitual, vamos aos aspectos jurídicos, de gestão e ergonômicos daquele que é teletrabalhador, o trabalho realizado da casa do empregado.

Acreditamos que a maior parte dos problemas jurídicos trabalhistas das empresas não são jurídicos, mas sim problemas de gestão, mais precisamente de gestão de pessoas. Estes problemas podem se tornar problemas jurídicos, mas seu DNA não é jurídico, sim de gestão, em especial gestão de pessoas.

É o descuido na gestão que faz com que problemas trabalhistas e previdenciários, principalmente no que se refere à saúde e segurança, provoque os passivos trabalhistas. A notícia boa é que se a maior parte dos problemas jurídicos trabalhistas nas empresas são de gestão, está na mão do dono do empreendimento a possibilidade de evitá-los, pois é ele quem imprime as características da gestão no seu empreendimento.
Entender a segurança jurídica trabalhista sob esta ótica é usufruir da possibilidade de identificar e sanar grande parte dos problemas jurídicos trabalhistas das empresas.

E aqui entra outro elemento de forte impacto na prevenção dos problemas trabalhistas das empresas, no âmbito da saúde e segurança no trabalho: a ergonomia.

Estes três aspectos, jurídicos, gestão e ergonômicos, permitem compreendermos a questão da segurança do teletrabalho, na modalidade trabalho em casa, tão discutido atualmente.

Os teletrabalhadores devem observar às normas de saúde e segurança em especial às Normas Regulamentadoras. Assim determina a Lei 13.467/17, art. 75-E “o empregador deverá instruir os empregados, de maneira expressa e ostensiva, quanto às precauções a tomar a fim de evitar doenças e acidentes de trabalho”.

E aqui está a ergonomia, que define os sistemas de trabalho, as características, habilidades e limitações das pessoas que o realizam, com vista ao seu desempenho eficiente, confortável e seguro, inclusive no teletrabalho. Para isso, os empregadores instruir seus teletrabalhadores sobre os parâmetros que permitam adaptação das condições de trabalho às características psicofisiológicas, conforme preconiza a Norma Regulamentadora NR 17-

Até porque, os empregadores só se isentam da culpa quanto ao possível acidente de trabalho ocorrido na residência do empregado, quando comprovarem que instruíram seus empregados.

A MACROERGONOMIA
A Macroergonomia, também conhecida como terceira geração de ergonomia, é uma abordagem de sistemas sociotécnicos, baseada em um método participativo, sendo implementada como instrumento para otimizar a eficácia organizacional, que proporciona proteção às pessoas físicas e segurança para as pessoas jurídicas.

A Macroergonomia é um importante instrumento de implementação das normas de saúde e segurança no âmbito do teletrabalho, uma vez que trata de questões organizacionais visando promover a gestão participativa do trabalhador na sua construção, condição fundamental para a empresa que possui teletrabalhadores, fisicamente distantes de seu controle presencial, visando a adaptação do ambiente organizacional ao homem, sem se descuidar da produtividade e da saúde do trabalhador.
 
Segundo Guimarães (2006),  a Macroergonomia é baseada em um método participativo, no qual o público envolvido no processo de trabalho contribui para que as intervenções que se façam necessárias tenham uma maior assertividade, pois reduz a margem de erros na sua criação e tem melhora e aceitação porque foi construído junto com os trabalhadores.
 
Sua forma de avaliação é por meio de uma abordagem única dos quatro subsistemas principais, incluindo as variáveis ambientais, tecnológicas e interpessoais que interferem nas interações sistêmicas entre os indivíduos e os dispositivos de trabalho, como forma de aperfeiçoar a produtividade (MEDEIROS, 2005; KLEINER, 1998).

Nesse caminho, os empregadores podem implementar programas de gestão de ergonomia, inclusive e principalmente para o teletrabalho, baseado no controle e melhoria contínua de processos (PDCA), seguindo as etapas a seguir:

Fase I: Treinamento de Ergonomia: 

O empregador deve sensibilizar os teletrabalhadores sobre a importância da ergonomia e os problemas de conforto que podem existir no ambiente de trabalho, da mesma maneira como eles podem resultar em lesões físicas e mentais.
 
Fase II: Análise da demanda: 


A origem da demanda consiste na descrição de um problema ou situação problemática, que justificaria a necessidade de uma intervenção ergonômica. A identificação da demanda (fator de possível risco), deve ser realizada de forma proativa, mediante aplicação do Questionário Ergonômico Online, com o proposito avaliar: i) a percepção dos entrevistados sobre a presença de queixas e desconfortos posturais, assim como oportunidades de melhorias; ii) o entendimento dos colaboradores sobre as características do seu posto e ambiente de trabalho aspectos relacionados à organização do trabalho, fatores cognitivos, psicossociais e tecnológicos.
 
Fase III: Políticas de suporte: 


Os empregadores devem fornecer suporte tecnológico, operacional e organizacional, a partir da implementação de ações corretivas baseadas no resultado do questionário online (Dashboard de ergonomia). Nesse ponto, importante analisar a eficácia das ações implementadas junto os teletrabalhadores.
 
Fase IV: Comunicação e Acompanhamento: 


Devido a distância característica da modalidade de teletrabalho, a comunicação desempenha papel fundamental na organização do trabalho. Nesta fase, os gestores devem fornecer suporte contínuo com feedback.

No teletrabalho há o deslocamento geográfico do trabalho, que exigirá das empresas novas abordagens no que tange as normas de saúde e segurança para seus teletrabalhadores.

Instruir expressa e ostensivamente, como determina a lei,  significa o empregador constituir prova de que todas as medidas na prevenção de acidentes e doenças do trabalho foram comunicadas, para que as empresas não se vejam, por conta da sua inadvertida inação, omissão, caso ocorra algum acidente com seu teletrabalhador, responsabilizadas por acidentes do trabalho – doença ocupacional. Não é preciso dizer que, além das consequências devastadoras para os trabalhadores, sua saúde, família, convívio social, o acidente do trabalho relaciona-se com o Fator Acidentário de Prevenção – FAP, índice aplicado sobre a Contribuição do Grau de Incidência de Incapacidade Laborativa decorrente dos Riscos Ambientais do Trabalho. 

A pedra de toque para a nova realidade do teletrabalho está contida em uma palavra: PREVENÇÃO.

Será a forma com que as empresas darão importância para a gestão de seus riscos trabalhistas e previdenciários no teletrabalho o seu diferencial, sob o aspecto da segurança e proteção da saúde de seus teletrabalhadores.

Como se pode notar, o casamento entre jurídico, gestão e ergonomia, será, sem dúvida alguma, a vacina mais eficaz para se evitar futuros problemas nesta seara, da saúde e segurança do trabalho para o teletrabalhador.

A visão interdisciplinar deste contexto permitirá as empresas usufruírem da tão almejada segurança jurídica trabalhista e previdenciária.

 
Eduardo Pastore – Advogado trabalhista. Mestre em Direito das Relações Sociais PUC/SP
Jair Ferreira Pinto – Gerente de Relações Trabalhistas e Sindicais da SOLAR – Grupo Coca-Cola
Luiza Cristina de Melo Silva – Fisioterapeuta/ Ergonomista da SOLAR – Grupo Coca-Cola